COVID-19 em atletas no campeonato brasileiro de futebol (Brasileirão) de 2020

 



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PUBLICADO NO:


Brazilian Journal of Development

ISSN: 2525-8761                                  

DOI:10.34117/bjdv7n4-175



COVID-19 in athletes in the Brazilian soccer championship (Brasileirão) 2020


Autores:

Moreno, M.Coelho,  M. L. R. A. & Câmara, F. P.


Resumo

Analisamos a incidência de Covid-19 entre jogadores do gênero masculino dos clubes participantes no campeonato brasileiro de futebol (Brasileirão) de 2020. Observamos um alto índice de infecção em relação à população geral, cerca de 13 vezes no período, denotando que os clubes atuam com clusters infecciosos eficientes.


O vírus SARS-CoV-2 (abreviação inglesa para “Severe Acute Respiratory Syndrome Coronavirus 2”) é o agente etiológico da Covid-19 (abreviação inglesa para “Coronavirus Disease 2019”), uma nova doença respiratória surgida no final do ano de 2019, em Wuhan, China (Câmara et al., 2020). O vírus rapidamente ultrapassou as fronteiras continentais e no dia 11  março de 2020 a Organização Mundial da Saúde (OMS, 2020) declarou a pandemia. Até o dia 23 de fevereiro de 2021, o Brasil contabilizou 10.195.160 infectados pelo SARS-CoV-2 (SUS Analítico, 2021).

A sintomatologia da Covid-19 inclui tosse seca, febre, cansaço, perda de olfato e paladar, dores e desconfortos, entre outros sintomas (Ministério da Saúde, 2021). Nos casos mais graves, pode ocorrer o comprometimento das vias áreas inferiores, causando a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), se fazendo necessário o suporte respiratório. Apesar das hospitalizações serem mais frequentes nos idosos, a maioria dos infectados são os jovens (Menod et al., 2021). Entre esses, atletas profissionais, jovens e saudáveis estão se mostrando suscetíveis a infecções pelo vírus, como registra-se nos clubes de futebol.

O presente trabalho analisa os possíveis motivos para a suscetibilidade ao vírus SARS-CoV-2 em atletas jovens e saudáveis, como uma contribuição para o controle epidemiológico da Covid-19. Com base nesse racional, realizamos uma análise retrospectiva da prevalência de Covid-19 em atletas do Campeonato Brasileiro de Futebol (Série A) no ano de 2020.

 

Metodologia

Analisamos a prevalência de Covid-19 nos atletas oficiais de futebol masculino, pertencentes aos grupos da Série A do Campeonato Brasileiro de Futebol no ano de 2020, com média de idades de 25,5 ± 5,1 anos. Os jogadores fazem prática extenuante de exercícios físicos, exigindo uma alta capacidade cardiorrespiratória. Os grupos do elenco oficial de futebol masculino de acordo com o site oficial de cada time de futebol estão elencados na figura 1, contabilizando um total de 625 jogadores pertencentes aos grupos da Série A do Campeonato Brasileiro de Futebol no ano de 2020. Os dados biométricos foram obtidos a partir dos sites oficiais de cada time pertencente da Série A do Campeonato Brasileiro de Futebol, além de sites de notícias esportivas, como o Globo Esporte e Confederação Brasileira de Futebol (CBF).

Os dados foram analisados pelo método do qui-quadrado em tabela de dupla entrada.

 

Resultados e discussão

O número total de jogadores participantes do elenco profissional masculino da Série A do campeonato Brasileiro de Futebol, em 2020, foi de 625, distribuídos em 20 times: Internacional, Flamengo, Atlético-MG, São Paulo, Fluminense, Palmeiras, Grêmio, Santos, Athletico-PR, Corinthians, Bragantino, Ceará, Atlético-GO, Sport, Fortaleza, Bahia, Vasco, Goiás, Coritiba e Botafogo. A média das idades era de 25,5 ± 5,1 anos, com distribuição das médias por clube muito próximas, como mostrado na  figura 1. 

Registrou-se que 302 (48,32%) desses jogadores testaram positivos para Covid-19 (Globo Esporte, 2021). A figura 1 mostra dados dos atletas e os números de infecções e a figura 2 permite visualizar a distribuição e magnitudes.


Figura 1. Relação entre o porcentual de jogadores do Campeonato Brasileiro da Série A (2020) que testaram positivo para Covid-19. 





Figura 2. Percentual de atletas infectados por clube em 2020.



Nesse mesmo ano o percentual de infecção na população brasileira foi estimado em aproximadamente 3,6% (Covid Center Map da John Hopkins Resource, 2021), ou seja, 7,7 milhões de casos confirmados em uma população de 211,8 milhões para 2020 (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE], 2020). A comparação (Qui-quadrado, 134,708, p  0,001) mostrou que o índice de infecção entre os atletas competidores era altamente significante em relação à população geral, evidenciando altíssimo risco desta atividade durante a pandemia, aproximadamente 13 vezes maior.

Também a média de casos por clube, 15,10 ± 7,42, foi muito elevada. Os atletas passam a maior parte do seu tempo em seus respectivos clubes durante o período de competições. Estes, portanto, são centros de aglomerações, eventos favoráveis á transmissão do SARS-CoV-2 cuja característica epidemiológica é de propagação em clusters.

 

Conclusão 

Os fatos apresentados neste trabalho mostram que a aglomeração foi o fator preponderante na transmissão da Covid-19. Os clubes tornaram-se centros superdisseminadores, não somente entre os que convivem em suas dependências, como também com os externos, pois os jogadores infectados circulam em seus ambientes familiares e sociais.

Acrescente-se a isso o fato de atletas serem mais vulneráveis à Covid-19, bem como outras infecções respiratórias, devido à depleção de IgA presentes nas mucosas do trato respiratório e digestivo (Kaetzel, 1991). A prática extenuante de exercícios físicos leva à uma redução nos níveis de IgA salivar após os mesmos (Gleeson et al., 2020; Nehlsen-Cannarella, 2000; Peters, 1997), o que favorece principalmente as infecções no trato respiratório superior (Anderson & Kippelen, 2008). Desse modo, além do fator aglomeração mencionado, devemos acrescentar também uma eventual vulnerabilidade de ordem imunológica.

Não encontramos registros de hospitalizações ou mortes por formas graves da Covid-19 nos atletas dos times aqui relacionados, talvez porque em sua maioria os atletas de alto rendimento sejam jovens e saudáveis. A faixa etária que mais se infecta pelo vírus SARS-CoV-2 está entre os jovens 20-49 anos (Monod et al., 2021; Estado de São Paulo, 2021; Secretária de Saúde da Paraíba, 2021; Boletim Epidemiológico de Santa Catarina, 2021), mas a letalidade mais significativa está na faixa acima dos 60 anos e na presença de duas ou mais comorbidades cardiometabólicas.

Do ponto de vista epidemiológico, apesar de não agravarem, esses atletas tornam-se inadvertidamente disseminadores eficientes ao circularem nos seus círculos sociais e familiares, particularmente se negligenciam as medidas de proteção.

 

Atualizado em 08/05/21





Cancelada a luta no UFC que envolvia a atleta brasileira Amanda Ribas.

O canal SportV3/Combate Ao Vivo divulgou que durante a semana os testes se mostravam sempre negativos, sendo que o último deu positivo.



Amanda Ribas, a atleta da esquerda, durante a pesagem, 07/05/2021. Seu pai e treinador também foram confirmados positivos para o teste. A atleta não apresentou sintomas. Imagem: Arquivo pessoal obtida do YouTube.com.




Referências do artigo

 

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Imagem esquemática do SARS-CoV-2 exibindo a espícula glicoproteica S

Imagem esquemática do SARS-CoV-2 exibindo a  espícula glicoproteica S
Ela é responsável pelo fenômeno de adsorção, a ligação do vírus à célula, e portanto, pelo início da infecção viral. O SARS-CoV-2 se liga às células através de um receptor, a enzima conversora de angiotensina 2 (ACE2), presente nas superfícies de células do pulmão, do intestino, do rim, e de vasos sanguíneos. Imagem: https://www.scientificanimations.com/C&EN/Shutterstock.

Imagem esquemática do SARS-CoV-2.

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Observe receptor presente na célula [ACE2] que se liga à proteína S. Human cell = célula humana; Glycoprotein = glicoproteína. Imagem: https://www.scientificanimations.com/C&EN/Shutterstock.

SARS-CoV-2 iniciando o processo de infecção.

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Fenômeno de adsorção - quando o vírus "toca" a célula com "segundas intenções". A menor quantidade de receptores ACE-2 nas células das crianças explicaria o fato desta faixa etária ser menor atingida por este novo coronavírus.